segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Geometria da Vida


Já tiveram a impressão de que o copo de 500ml não é muito maior do que o copo de 300ml? Eu sempre fiquei incomodado com isso... Como será que um pequeno aumento desses no tamanho e largura do copo podem acomodar quase o dobro do volume de um copo de 300ml? A matemática explica.
A relação superfície/volume é extremamente importante em estudos biológicos: ela muitas vezes determina mudanças de forma associadas à mudança de tamanho. Fica mais fácil de explicar com figuras idealistas. Um quadrado de lado 1cm, possui área 1cm2, e volume 1cm3.
Vamos aumentá-lo em uma unidade, agora. Ele terá lado 2cm, área 4cm2 e volume 8cm3. Caso aumentássemos ainda mais o aumento em unidades de medida continuaria desproporcional, porque a área aumenta ao quadrado, enquanto o volume aumenta ao cubo. E o que isso tem a ver com os organismos? TUDO!
Os organismos respondem às leis da física, da mesma forma como os planetas, ou o pão que cai da mesa (geralmente com o lado da manteiga voltado para baixo...). Flutuabilidade, capacidade de vôo, velocidade, entre outras características são diretamente dependente da anatomia dos animais. Por isso, a forma do animal deve atender às demandas físicas.
Imaginem por exemplo, uma ave voadora. A estrutura de ossos, músculos e penas da asa, devem estar equilibradas com o tipo de vôo e peso do animal. Uma ave que crescesse demais e mantivesse as proporções da asa e corpo, por exemplo, talvez ficasse tão pesada (já que o volume e peso do corpo aumentam em proporções diferentes da área da asa), que talvez não conseguisse alçar e manter vôo.
Mudanças de forma, função e hábito caminham em paralelo. Ainda falando das aves, as aves grandes e pesadas em geral deixam de voar, ou alçam vôo com mais dificuldade, e passam a ser mais cursoriais (andam no solo) ao longo de suas evoluções; avestruzes, galinhas e perdizes exemplificam bem essa tendência.
Devemos tomar cuidado com extrapolações e determinismos: nem sempre a mudança do tamanho está diratamente à mudanças no hábito. O Kiwi, por exemplo: Não, não este kiwi! Este aqui: do gênero Apteryx (“sem asa”, em grego). Esta ave sofreu uma grande redução do tamanho do corpo ao longo da sua evolução, se comparado com outras ratitas (grupo que engloba aves como avestruzes, emas, e o extinto moa). Alguém poderia então alegar que ele é um exímio voador! No entanto, ele não só não voa (não possui asas, como o nome do gênero indica) como é um excelente corredor! Mas todas as ratitas vivas são cursoriais, e o kiwi não é exceção. Por causa das características herdadas por seus antepassados e não modificadas no curso da evolução, como redução das asas, por exemplo, o tamanho de corpo dele nada tem a ver com capacidade de vôo; talvez tenha com sua velocidade na corrida.
É interessante quando encontramos intersessões disciplinares! Matemática, física e biologia se unem nos estudos de evolução da forma, que desperta interesse em pesquisadores de diversos lugares e áreas de estudo. Espero ter conseguido ilustrar um pouco a importância da geometria nas formas biológicas para que os organismos sejam o que são, e façam o que fazem. Este assunto possui uma vasta literatura de grande espectro de abrangência; talvez mais pra frente a gente volte a discutir um pouco mais sobre a evolução da forma!